sábado, 23 de maio de 2020

Parto Orgásmico

Este texto foi escrito a pedido de uma amiga, lá de Franca-SP, pra ser postado na página da equipe dela, Isis - Gestação e Nascimento.

Levanta a mão quem sabia que é possível sentir prazer e até mesmo ter orgasmos durante o parto? Chega mais pra saber!



Ao lermos relatos de parto de mulheres que vivenciaram uma assistência humanizada, não é incomum mulheres que relatam o momento sem dar ênfase à dor, ou contam a experiência como um momento de prazer, crescimento, transcendência, entrega, além e apesar da dor. Porém, infelizmente, esses relatos ainda causam estranheza diante de grande parte da sociedade, onde parto ainda é sinônimo de dor e sofrimento.
  

Vivemos em uma sociedade patriarcal, culturalmente machista, falocêntrica e opressora dos desejos femininos, principalmente quando falamos em sexualidade. Desde pequenas somos ensinadas como nos portar, a reprimir nossas pulsões e sensações. Não podemos nos tocar, é feio. É sujo.  O resultado é que crescemos sem conhecer e entender as capacidades e prazeres que nosso corpo, inclusive aquelas vindas do nosso útero, outrora tão conhecidas. Criamos, então, mulheres desconectadas com o próprio corpo, com o verdadeiro feminino.
Mas é impossível fazer de gravidez parto, amamentação, sem falarmos em sexualidade. Todos são processos intensos e intimamente ligados a sexualidade, não apenas por se situarem no mesmo local. Compartilham musculaturas, terminações nervosas, hormônios, sendo o principal e mais conhecido, a Ocitocina, também conhecida como “hormônio do Amor”, por estar presente em todas as relações humanas que envolvem sentimentos, e nas relações sexuais e orgasmo. Ocitocina está presente no momento do parto, levando as contrações uterinas, na amamentação, na ejeção do leite, e nos vínculos formados ao longo da vida.


E aí chegamos ao Parto Orgásmico. É possível, além da ressignificação da dor, sentir prazer ao parir? Um orgasmo? Ao conseguirmos voltar nosso olhar ao processo como parte da sexualidade humana, como já descrito acima, é possível entender como esse prazer poderia acontecer. Mas para além desse olhar, precisamos recuperar nosso feminino, o conhecimento de nosso corpo, nossos prazeres. É preciso entender o parto como um processo fisiológico e se permitir viver esse processo. Liberar o corpo ser livre para sentir.


É possível se preparar para um parto orgásmico? O primeiro passo é se livrar de cobranças e expectativas. Tudo que possa gerar tensões. Assim como no sexo, este é um momento de intenso relaxamento, o pico máximo de prazer feminino após um estímulo. A diferença entre dor em prazer no parto está, também, diretamente ligada à liberdade que a mulher tem em relação ao local de parto, à equipe, aos acompanhantes. Mulheres que são se encontram em um ambiente acolhedor, aconchegante, que lhe permite estar relaxada e conectada consigo mesma e com seu corpo tem maiores chances de alcançá-lo. Por isso uma equipe bem preparada e um ambiente adequado fazem toda a diferença no processo de parturição. Se entregar ao processo, respeitar as sensações e “pedidos” do corpo também são importantes para que se possa alcançar um estado de relaxamento capaz de proporcionar prazer. Prazer este que não é causado apenas pela passagem da cabeça do bebê no canal vaginal, mas por toda “explosão” hormonal, movimentos musculares e estímulos nervosos.
O mais importante, e lição que acredito que devemos levar de tudo isso, é entender a importância de resgatarmos o poder do feminino, a força do nosso útero, uma força transcendental, que atravessa gerações de mulheres. Conhecer o próprio corpo, o que lhe dar prazer. Se empoderar na construção do parto, para que seja um momento de respeito, de protagonismo, de segurança, em que possa, enfim, se entregar as maravilhosas sensações que a “partolândia” pode trazer.


” Sinto que Victor entrou na água, e me puxa pra apoiar nele. Me entrego, relaxo. Consigo respirar e voltar a concentrar. SAI, JOANA! Falo, e escuto risos. E a cabecinha sai. Ah! Fico ali, acariciando a cabecinha enquanto ainda não consigo acreditar. (...) Não sei dizer quanto tempo estivemos assim. Sinto Joana mexendo dentro de mim. Me dá muito nervoso aquela sensação. Porque não sei explicar o que sinto. Sinto todo meu corpo respondendo àqueles movimentos, àquela sensação. Cada músculo. (...) Caraca, que é isso? Como descrever? Apenas sentir.”
                                                           Nascimento Joana – PDAC (Parto Domiciliar após cesarea)




Luciana Morais
Enfermeira Especialista em Saúde Materno Infantil e Aleitamento Materno

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